26.6.09

Afasta de Mim esse Cálice - 10 Músicas que foram Censuradas

Gil e Caetano no exílio em London London




Fragmento de documento que vetou a música Geleia Geral.



1.Oculoescuro (Como vovó já dizia), de Raul Seixas e Paulo Coelho

A letra original do hoje consagrado escritor Paulo Coelho foi rejeitada uma e outra vez por ser considerada “veiculo de mensagem subversiva”. Curioso foi que o veto não alcançou ao refrão, que é uma clara referência ao uso de colírio ou óculos escuros para esconder a irritação de olhos provocada pela maconha. Raul teve umas 35 músicas censuradas e chegou a inventar palavras só para infernizar a vida dos fiscalizadores.

2. Herói do medo, de Carlos Lyra

Alguns trechos da letra resultaram insuportáveis para a censura, como “odeio a mãe por ter parido”. Por causa de versos como este, o relatório diz “o autor apresenta ego psicótico”, entre outras barbaridades. A música foi liberada em 1975, quando Carlos Lyra morava no estrangeiro.

3. Buscando amor, de Cláudio Nucci e Mauro Assumpção

O problema foi com os versos “baseado no que eu digo eu já ando hoje em dia”. Os autores tentaram explicar que, no caso, “baseado” é uma forma verbal e não um substantivo, mas não houve chance, assim mesmo a música foi barrada.

4. Pátria amada, idolatrada, salve, salve, de Geraldo Vandré

Além dos casos mais conhecidos como Caminhando (Para não dizer que não falei das flores) e Canção da despedida, Geraldo Vandré teve muitas outras músicas censuradas. A escolhida aqui, só pelo fato de fazer menção aos símbolos pátrios, o que era expressamente proibido pela ditadura. Também não era permitida qualquer menção duvidosa à cor vermelha, associada ao comunismo. Geraldo Vandré, tachado de “compositor subversivo” teve a carreira e a saúde prejudicadas pelas proibições.

5. Deus e o diabo, de Caetano Veloso

Como é sabido, Caetano não só teve músicas censuradas. Ele foi preso, proibido de trabalhar e exilado. Na volta, o regime estava forte ainda e os problemas continuaram. Com esta música foram quatro anos de idas e voltas a Brasilia. A marchinha de carnaval com sua associação de deus ao diabo irritou a religiosidade arcaica dos milicos. Nos últimos versos da versão original: “cidades maravilhosas dos bofes do meu Brasil”, o vocábulo bofes precisou ser substituído pelo vocábulo “pulmões”.

6. O mestre-sala dos mares, de Aldir Blanc e João Bosco

A música originalmente foi chamada “O almirante negro”, mas um funcionário disse ao autor que tal título representava uma “apologia do negro”, o que mostra mais uma vez que, além de retrógrado, o regime que imperou desde 1964, também foi racista.
Cansado das modificações e para flagrar a idiotez dos seus algozes, o grande poeta Aldir Blanc incluiu uns versos surreais que permaneceram na canção, como “glória à farofa, à chachaça, às baleias”.

7. Pare de tomar a pílula, de Odair José

Só um exemplo emblemático entre muitas músicas que o então popularíssimo Odair José teve questionadas. O problema com ele não era o engajamento político mas as letras que atentavam “contra a moral e os bons costumes”, essa frase imbecil que os reacionários adoravam. Um funcionário com pretensões românticas disse um dia ao artista: “O amor não é do jeito que o senhor canta”.

8. Geleia geral, de Torquato Neto e Gilberto Gil

Perseguido e exilado junto com Caetano Veloso, Gilberto Gil sofreu censura prévia de muitas músicas. Esta, com belíssima letra do poeta Torquato Neto, foi rejeitada pelo “claro sentido político e contestatório”. Pois é, a geleia geral brasileira dos tempos da ditadura.

9. Nada será como antes, de Ronaldo Bastos e Milton Nascimento

O título já dizia tudo, mas o problema foi com o verso “Que notícias me dão os amigos?” em alusão aos exilados por motivos políticos.

10. Bolsa de amores, de Chico Buarque

Chico foi, junto com Taiguara, um dos campeões das letras proibidas. Dele recusaram Cálice, citada no título deste texto, Acorda amor, Apesar de você, Tanto mar, todas da peça Calabar e muitíssimas outras. Essa Bolsa de amores está entre as menos conhecidas e nem é das mais brilhantes ou comprometidas. Ela apenas faz um paralelo entre o linguajar da bolsa de valores e uma conquista amorosa. Porém, foi devolvida. No veto, os censores dizem que “o autor está muito preocupado em denegrir as mulheres”. Como Chico foi genial até para driblar à censura, criou um compositor e até uma história sobre ele, o Julinho da Adelaide, que passou a assinar as músicas que poderiam ser objeto de proibição. Mas o truque foi descoberto quando os funcionários da DCDP perceberam que o dinheiro dos direitos autorais do Julinho ia pra conta de um tal Chico Buarque de Hollanda.



A censura oficial existiu no Brasil desde 1934, quando foi decretada por Getúlio Vargas, mas seu periodo mais atuante começou com a ditadura de 1964 e a criação da Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP), que teve mais força ainda depois da entrada em vigor do AI-5. O órgão que chegou a examinar sessenta mil músicas tinha sede em Brasília. As grandes gravadoras tinham advogados contratados só para lidar com os censores, policiais federais deslocados de outras funções sem o menor preparo para a compreensão de obras artísticas. A censura foi abolida no Brasil em 1988.



Fontes e bibliografia: Arquivos próprios; documentos do Arquivo Nacional; Site censuramusical.com; A canção no tempo Vol 2, de Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello; Verdade Tropical, de Caetano Veloso; Nada será como antes, de Ana Maria Bahiana; História Social da Música Popular Brasileira, de José Ramos Tinhorão.

Foto de Caetano e Gil na Inglaterra sem crédito do autor
Foto de jornaleiro exibindo o Jornal da Tarde, em 1968, com o endurecimento da censura e o anúncio do AI-5





POST SCRIPTUM: Post retirado totalmente do blog Nem Vem Que Não Tem.